06 dezembro, 2015

NO SILÊNCIO DA LAGOA


Sentado na rocha, agasalhado por uma calma turbulência
nestas horas tardias escorrendo tão prenhes da tua ausência
relembro o derradeiro mergulho nas águas límpidas da lagoa
quando me tornaste a amar antes de abalares para Lisboa

Habitavas-me e percorrias-me à beira deste mar cristalino
buscando (febrilmente) os mistérios do meu corpo franzino
e os teus belos cabelos (desgrenhados) pelo vento zurzidos
chicoteavam o silêncio em redor da lagoa povoada de gemidos

Acariciando-nos, o Sol ardia (num fundo azuláceo) inclemente
as águas cúmplices e revoltas lambendo os pés languidamente
– a inquietude vislumbrando as areias rasgadas pelo caranguejo
enquanto me apertavas e abraçavas (raivosamente) com desejo

Antes de me deslumbrar com a força portentosa do teu abraço
e depois de mergulhar o rosto nesse tórax vigoroso feito de aço
o teu cheiro convocou o cio... esta sede que só tu sabias saciar
quando (poderoso) me esmagavas, apressando no peito o arfar

Libertando sussurros perdidos no areal vagando sem dimensão
buscavas a certeza de que permanecia contigo no mesmo chão
Venceste-me (louco de prazer) na orla penumbrosa de outrora
e abraçando-me (vestido de seiva) fizeste tenção de ir embora

Estava transfigurado, convertido em líquido, todavia fascinado
– êxtase sublime de quem se sente amado, plenamente saciado
Mas atirando-nos novamente nas águas translúcidas da lagoa
amaste-me outra vez (loucamente) antes de retornares a Lisboa

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in «A Lagoa de Óbidos, o Mar e Eu», página 202
MP Edições, Outubro 2015

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