Os meus pais não passavam de dois adolescentes quando se casaram,
escassos meses antes de eu ter nascido. Ele acabara de completar dezasseis anos
de idade; a minha mãe tinha dezassete. Ele dava ainda os primeiros passos no
mundo do futebol; ela não passava de uma menina rica, mimada pelos papás, que
fazia dele o seu capricho favorito. Não se amavam; sentiam apenas atracção
física. Aos olhos do meu pai, ela era uma boazona sedutora com quem se divertia
sexualmente. Exibia-a aos amigos, acompanhava-a às festas do Jet Set,
pavoneava-se com ela nas colunas sociais. Era, acima de tudo, alguém com quem
se poderia afirmar publicamente, já que a família dela fazia parte do tão
badalado Jet Set nacional. Não obstante a atenção que a imprensa
especializada lhe começava a dedicar, a ela tudo isso agradava porque deixava
de ser fotografada unicamente ao lado dos pais para agora ostentar com vaidade
o namorado como se ele fosse um troféu; por sinal um belo rapaz, elegante, gracioso,
aparentemente mais velho do que ela e, ainda por cima, um craque da bola de
quem se vislumbrava uma carreira fulgurante. Creio que mantinham relações
sexuais com bastante frequência sem tomarem precauções porque a gravidez
apanhou-os de chofre, levando-os ao casamento.
Nunca foram felizes juntos. A minha mãe vivia preocupada
com futilidades banais, passava o tempo todo com as amigas nos cabeleireiros, a
fazer compras nos centros comerciais mais sumptuosos da cidade ou a tomar
chazinhos com as tias de Cascais. Marcava sempre presença nas estreias
de espectáculos, ia a todas as vernissages, nunca perdia os lançamentos
de colecções dos costureiros e ficava fula da vida quando alguém se esquecia de
a convidar para qualquer evento social. Raramente parava em casa. Eu sentia-me
abandonado por ela; era como se fosse uma pedra no seu sapato. Ignorava-me,
deixando-me aos cuidados de uma ama. Já o meu pai dedicou-me sempre mais
atenção: preocupava-se comigo, dava-me o amor de que um filho necessita.
Entre os meus dez e onze anos de idade, comecei a
desconfiar de que a minha mãe traía o meu pai. Várias vezes atendi chamadas de
um desconhecido à sua procura e, quando ela falava com ele, notava demasiada
intimidade no seu tom de voz. Passava tempos infinitos grudada ao telefone:
cavaqueavam como se fossem velhos amigos. As minhas suspeitas de ela ter um
amante não tardaram a confirmar-se quando, alguns meses após o meu pai ter
sofrido o fatídico acidente que o impossibilitou de voltar a jogar, ela fugiu
com outro homem. Deduzi que fosse o mesmo que lhe telefonava. Passaram-se mais
de seis anos e eu jamais tornei a vê-la.
O meu relacionamento com ela nunca fora sadio, ao
contrário daquele que eu mantinha com o meu pai. Ele era o meu ídolo. Desde que
me lembro, levava-me regularmente ao futebol, aos treinos, ao cinema, à praia e
a acampar. Sentia-me muito bem com ele e, apesar de magoado, não estranhei
quando a minha mãe nos abandonou, deixando-nos sozinhos.
Tanto eu como o meu pai chamamo-nos Vanderlero. A partir
da adolescência passei a ficar mais parecido com ele, ao ponto de algumas pessoas
nos confundirem. A ele chamavam-no Vanderlão; a mim, Vanderlito. Todavia, eu
adoptei um diminutivo que achava mais engraçado: Valero. O meu pai gerou-me aos
dezasseis anos de idade; assim sendo, quando atingi a maioridade ele só tinha
trinta e quatro. Era ainda um bom pedaço de homem, atraente, sedutor, no
esplendor da sua jovialidade!
Excerto do primeiro conto incluído no livro «O Pranto do Cisne»
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O
PRANTO DO CISNE
Autor:
Isidro Sousa
Edições
Sui Generis
PVP:
13,90 euros
PROMOÇÃO
ESPECIAL LANÇAMENTO:
12,00
euros (Portugal)
16,00
euros (fora de Portugal; qualquer país, incluindo Brasil)
Valores
finais; incluem despesas de envio. Envios contra-reembolso: acrescem despesas
dos CTT; só aplicável para moradas portuguesas.
EDIÇÕES SUI GENERIS
Livraria: www.euedito.com/suigeneris
Página: http://letras-suigeneris.blogspot.pt/
Email: letras.suigeneris@gmail.com
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